O medo do poder de uma mulher fez o patriarcado criar falsos modelos de mulheres extremamente desconectadas de si mesmas. Fomos obrigadas a nos encaixar na base da força do braço forte do sistema para sermos mais “convenientes” aos dogmas. Ou santas, ou bruxas. E as bruxas já sabemos onde foram parar…
A nossa alma enorme, brilhante e íntegra precisou fazer um esforço de retalhamento pra caber nesses formatos. Desde onde minha memória alcança, este modelo roubou o meu poder e muito provavelmente você também vai se reconhecer nele: a mulher boazinha, programada pra só dizer “sim”. Ela não tem vontades, não tem desejos, está sempre se submetendo a vontade do outro.
Abriu a nossa cartilha, tá lá escrito na primeira página: você deve sempre dizer sim, e ser uma boa garota. Sim para os desejos dos homens. Sim para os formatos que querem nos impor. Sim para aquilo que dizem que somos. Então aprendemos a ser exímias em atender a vontade do mundo, ignorando que agindo assim estamos dizendo “não” para a nossa própria alma.
Eu já fui uma bela senhorita do “sim pra geral”, linda e querida por todos, vivendo sob o medo de desagradar. Carente. Inconsciente de mim mesma. Com receio imenso de ser rejeitada. Se vocês me vissem no trabalho no começo da minha carreira, aos 20 anos, veriam que eu era aquela que não dizia não nunca, mesmo que aquele sim fosse sugar minha energia e me apática e depressiva.
Daí você pode dizer “mas pra você conseguir algo na vida precisa fazer coisas que não gosta”. Pois é, foi isso que gravaram em pedra na sua cabeça. Então comecemos desde já a rever essas crenças?
Você precisa fazer esforços, sim, entregar-se aquilo que faz o seu coração bater forte de forma integral e com muito esforço. Mas veja bem, isso é bem diferente dessa autopunição com um comportamento que nega nossos limites e viola nosso espaço.
Quem incutiu em nós essa ideia de que temos que dizer “não” para nós mesmas, como castigo, foi a Igreja, não por acaso, um dos pilares de sustentação do sistema patriarcal. Devemos ser punidas com dores, já que um Deus punitivo teria nos castigado com a dor do parto, a dor de sangrar todo o mês, a dor de carregar o pecado do mundo nas nossas costas largas por Eva ter comido a maçã.
Fomos tão programadas pelo sistema que acreditamos nessa teoria, né? Que tolice! Se tem algo que Deus nos concedeu foram bênçãos. Somos a única porta de entrada para este mundo. Sangramos todo o mês e não morremos, num processo profundo de acesso aos segredos do nosso inconsciente. Renascemos das cinzas como Fênix. Querem dádivas maiores do que essas?
Mas você não sabe disso porque não foi assim que te ensinaram. Então, mesmo que você não tenha consciência, lá no fundo acha que não merece nada de muito bom. Quantas vezes você já disse “sim”, querendo dizer “obrigada, eu não quero”? Quer ver só…
Você não queria mais transar com o cara. Mas já estava ali. Transou, não sentiu nada. E ainda por cima fingiu orgasmo pra não desagradar (essa é a pior na minha opinião).
Ele é um mala e te enche o saco por direct. Mas você não diz “não” para não parecer mal educada.
Te chamam pra sair e você não quer. Mas diz que vai pra não desagradar.
Já saiu de várias relações sem saber mais daquilo que gostava de tanto “sim” que disse ao parceiro.
São muito “sins” inconscientes.
Esses pequenos “sins” que dizemos sem vontade, vão anulando aquilo que somos, roubando nossa energia como verdadeiros vampiros encostados no nosso pescoço. Quebrar esse padrão é um trabalho hercúleo, mas de resultados transformadores e empoderadores. Você vai criando o seu espaço, e um círculo de proteção ao seu redor, e fazendo dele o seu templo. Vagabundo não chega mais botando banca como se você fosse uma feira livre.
“Você tem que satisfazer o seu parceiro”, quantas de nós achamos que esse é o modelo de conduta feminina dentro do relacionamento? Mesmo que o preço dessa postura seja o desconforto do nosso próprio corpo. Uma vez vi uma entrevista com a Preta Gil e ela dizia que achava sexo anal desconfortável e não ia fazer só porque o parceiro queria. Errada não tá.
O seu “não”, não precisa ser grosseiro, não é sinônimo de má educação, nem de egoísmo. Egoísmo é o outro achar que você tem obrigação de querer tudo o que ele quer como se você fosse um objeto subserviente. E você não tem que fazer questão de pessoas que pensam dessa forma.
Não mutile sua alma com essa navalha afiada que o patriarcado usa pra cortar nossa pele real. Não se submeta ao que te desconforta pra satisfazer o desejo de um homem, da sociedade, da família, do pai dos seus filhos, do seu chefe, ou quem quer que seja. Saber impor os seus limites é não se violentar, e não se violentar é o primeiro passo do verdadeiro empoderamento feminino.
Todo lugar tem suas regras. Crie as suas e faça delas a sua lei.
Dizem que Deus criou o universo através do verbo. Nos contos de fadas a mágica acontece somente sob a invocação de uma palavra. Nos filmes, bruxas, feiticeiras, magos, lançam mão dos mais diversos recursos, mas não realizam nada de extraordinário antes de uma sonora palavra.
A palavra tem poder, acreditem, meninas. Uma mulher precisa entender isso, a começar pelo poder de dizer “não” com firmeza e elegância. Você tem magia dentro de si, mas jamais saberá como usá-la se terceiriza a sua vida, dando poder de decisão aos outros.