Prepare o bolso, Belenense, porque o conselho municipal de transporte aceitou os argumentos dos empresários de transporte público para justificar a passagem de ônibus em Belém na casa dos cinco reais. Ainda que pese todos os aumentos de insumos, não tem como a gente se conformar com este valor diante da qualidade da frota, composta por veículos que ejetam suas portas, dão prego no meio da rua e ainda colocam nossa vida e segurança em risco a cada curva graças a pilotagem de seus bem treinados condutores.
Agora que a proposta de 5 reais foi aceita em debate, resta saber quão fundo o prefeito Edmilson Rodrigues vai permitir que seja esta facada, já que cabe ao gestor municipal o poder de sanção ou veto. Conhecendo um pouquinho de política como eu acho que conheço, acredito que Ed deve atenuar o baque pra tarifa morrer na casa de R$ 4,50… ainda é um aumento grande, mas perto da proposta inicial parecerá uma conquista que deixa o usuário anestesiado, o prefeito bem na fita e o empresariado de bolso cheio graças ao princípio econômico da ancoragem – uma técnica usada por vendedores de colocar um produto caro ao lado de algo exorbitante para, em comparação, o preço que se pretende não parecer tão elevado assim.
Que esse aumento vinha todo mundo já sabia, a dúvida era o quando ele ia pesar no nosso bolso. E se for sancionado tal qual proposto vai pesar muito, mesmo: considerando o poder de compra reduzido graças a inflação que chegou a 10% ao ano só 2021, chegar com um trabalhador que ganha pouco mais de 1.200 paus e falar que ele vai gastar dez reais por dia só pra ir e voltar do serviço é um acinte. Pior ainda se o coitado tiver de pegar dois ônibus… já pensou gastar 20 conto apenas para ir trabalhar? Ao final do mês seriam 400 reais gasto no busão, ou quase 1/3 do salário mínimo. Sem condições.
A trombeta do apocalipse rodoviário começou a soar quando o Setransbel veiculou aqueles anúncios na TV falando que os aumentos do Diesel inviabilizariam a manutenção da atividade das empresas de transporte – um alarmismo que poderia funcionar, caso medo fosse vaselina pro nosso bolso. Mas não é. O preço do combustível está alto, realmente, mas gostaria de saber onde estão estes empresários, que aplaudem o governo a cada reforma que retira nossos direitos, protestando contra a política econômica do governo federal. Aí comem abiu, será?
E vou além: se o sindicato das empresas alega que não teria condições de oferecer o serviço, acho que a prefeitura teve, ali, uma oportunidade de ouro de dizer “então tchau, né” e resolver a situação do transporte.
Vejam bem: na capital paraense não existe licitação para o transporte urbano. Existe uma concessão, regida por decreto. Se a parte responsável pela execução do serviço está insatisfeita, a gente podia aproveitar para abrir um processo de licitação com critério de menor preço e ver quem poderia ofertar serviço de melhor qualidade com um custo-benefício mais interessante.
A forma de fazer isso seria tornar o sistema mais eficiente: segundo um cálculo do Setransbel, cada cobrador encarece em mais de 70 centavos a passagem de ônibus… mas será que essa figura é necessária? Com os cartões de passe fácil e pontos de recarga espalhados pela cidade (além das estações do BRT poderia ter nos shoppings, em finais de linha etc), cada pessoa poderia passar o seu cartão e liberar a catraca. Outra alternativa seria o pagamento com cartão de crédito por aproximação, para quem gosta dessas modernidades, e aí já teríamos esse aumento de 5 reais diminuído para 4,30, além da possibilidade de implantação de mais fileiras de bancos para acomodar um número maior de passageiros por veículo.
“Ah, Ingo, mas aí o cobrador ficaria desempregado” – sim, a consequência da tecnologia é a extinção de atividades supérfluas, mas isso traz um benefício maior pra sociedade do que segurar uma vaga de emprego desnecessária – ou alguém aí ainda contrata datilógrafos?
Eu duvido que as empresas que operam em Belém teriam interesse em fazer este investimento, porque o pedido deles, na verdade, é por mais dinheiro: toda vez que se discute o transporte público em Belém os empresários alegam que o serviço é todo custeado pelas passagens (aliás, como qualquer outro negócio, né, você depende dos seus clientes não é algo incomum na iniciativa privada) porque eles querem uma casquinha do governo, tal qual ocorre em fortaleza em que a prefeitura paga 6 milhões por mês para as empresas de ônibus rodarem pela cidade enquanto ainda cobram passagem. Parece justo este tipo de subsídio pra vocês, pagar na catraca e também através de imposto?Se for pra ser assim, acho mais viável e interessante a prefeitura deixar a mão invisível do mercado dar um aceno de adeus para as empresas de ônibus e municipalizar o serviço. Seria um investimento inicial grande, que necessitaria de um empréstimo a juros baixo para aquisição de frota, mas ao menos a PMB teria condição de executar um trabalho sem visar lucro para manter a tarifa sob controle e finalmente trazer as melhorias que a população clama e merece, além de permitir que o prometido sistema de integração, que desagrada aos empresários porque significa o pagamento de apenas uma passagem para pegar dois ônibus, passe finalmente a funcionar. Resta saber se vamos aproveitar essa oportunidade de ouro, ou pagar uma passagem a peso de ouro toda vez que subirmos em um coletivo caindo aos pedaços.