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Ingo Müller | A pandemia mascarada

A prefeitura de Belém divulgou nesta segunda-feira que não vai mais publicar o boletim Covid-19, um informe elaborado pela equipe de comunicação do município que trazia dados sobre ocupação de leitos, infecções e óbitos causados pela pandemia. Segundo a prefeitura, o boletim não vai mais ser emitido porque nos últimos dez dias a taxa de ocupação de leitos de UTI exclusivos para Covid foi zero – uma excelente notícia! Esta estabilidade, segundo a gestão municipal, permite que essas acomodações sejam usadas para tratar outros tipos de pacientes, dando fim a divisão entre leitos comuns e exclusivos para pacientes de infectados pela doença.

Como cidadão, comemoro este fato porque a mudança marca uma evolução no enfrentamento desta moléstia que, sem dúvida, só foi possível graças às vacinas. Como jornalista, saliento que o boletim foi essencial para nossa cobertura nos últimos anos já que, diante de uma doença letal, a informação correta pode salvar vidas – e isso só é possível quando o agente público é transparente com a imprensa e, por tabela, com a população.

Só que ao acabar com o boletim desta forma a prefeitura está passando uma informação contraditória. Explico: em 30 de março o governo do estado publicou o decreto 2.265/2022, com novas diretrizes para o uso de máscara em todo o Pará. Esta publicação permitia a flexibilização do item em locais abertos, mas deixava as prefeituras com a decisão final sobre o tema.

As cidades da região metropolitana anunciaram que, a partir daquele dia, o uso de máscara não era mais obrigatório nos espaços abertos – mas em Belém, que desde o começo da pandemia estava alinhada com o estado, a novidade não vingou: mesmo após o decreto do governo, a prefeitura manteve a obrigação das máscaras em todos os espaços coletivos, sejam abertos ou fechados, públicos ou privados, como forma de prevenção da doença provocada pelo coronavírus.

A mesma Belém, com alguns dos melhores índices de vacinação do Pará, não libera o item de proteção que, nas cidades vizinhas, já se tornou opcional. E a mesma Belém que mantém a proibição também é aquela não realiza fiscalização devida, já que na cabeça de muitas pessoas a máscara é opcional faz tempo… e pelo menos eu nunca vi ninguém sendo tirado do ônibus por causa disso.

Não estou fazendo lobby contra máscaras. Pelo contrário, fui seu defensor ferrenho desde que a OMS ressaltou a importância do equipamento de proteção para toda a população. Mas, como jornalista, acredito que qualquer órgão precisa ter coerência em seus posicionamentos para passar uma mensagem clara para os seus interlocutores – caso contrário, como dizia o saudoso Chembra Bandeira, a coisa fica parecendo meio pau, meio tijolo.

Considerando isso, me parece que a gestão municipal emite uma mensagem assim, combinando madeira e alvenaria, graças a suas ações contraditórias. Se por um lado Belém mantém as máscaras, alegando uma necessidade sanitária, por outro informa que há dez dias não existem pacientes internados em estado grave nos hospitais municipais e, por isso, não sente mais a necessidade de emitir boletins de saúde. São duas coisas que apontam para lados diferentes e, para piorar, como podemos avaliar a evolução da pandemia – e a necessidade de máscaras – sem os referidos boletins? A decisão de abandonar as máscaras vai ser baseada em achismo, ou os dados continuarão sendo compilados, mas de forma secreta?

Meio incoerente que informação e prática, que devem andar de mãos dadas, passem mensagens diferentes. A mesma prefeitura que hoje nos faz comemorar a desocupação de UTIs lembra que não temos uma pandemia controlada a ponto de deixar as máscaras de lado – pelo menos por enquanto. Vale destacar que, hoje, apenas Belém e Maceió não liberaram ainda as máscaras em locais abertos – mas na capital do Alagoas há uma questão judicial ainda se arrasta, enquanto em Belém a impressão que temos é que não há consenso do ente público sobre o estado atual da pandemia.