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BT PET | Notas sobre o dia do médico veterinário

No último dia 09 comemoramos o dia do médico veterinário e isso me pôs a pensar em algumas coisas… Minha história com a medicina veterinária se parece com a de muitos colegas de profissão.

Eventualmente me perguntam como eu descobri que queria ser médica veterinária. Eu nunca soube dizer o momento. Acho que já nasci sabendo que o seria (e não é exagero).

Eu não tinha qualquer referência da profissão em casa. Fui nadando contra a maré de pessoas que diziam que eu deveria fazer medicina ou direito, porque “veterinário morre de fome”, ou que “cuidar de bicho é perda de tempo”. Nunca dei ouvidos ou esmoreci. Sempre tive certeza da minha missão e de que faria aquilo dar certo, porque o faria com amor e dedicação.

Quando me graduei, os impactos foram imensos, porque a faculdade nos forma como técnicos, nos ensina a identificar uma doença e a tratá-la, mas esquece de nos habituar à ideia de que tratamos um paciente e não uma doença. Uma coisa é totalmente diferente da outra.

Tratamos o Bob, cachorrinho que ajudou a tirar o seu José da depressão. Tratamos a Pandora, a gatinha de um casal super dedicado, que infelizmente não pode ter filhos. Cuidamos do Thor, o cão que é o fiel companheiro de uma criança autista, a qual encontra no seu bichinho o seu alento. Tratamos o Bolinha que, quando adoece, faz com que a família inteira faça questão de estar presente no consultório.

Todos os dias saímos de casa com a missão de levar saúde e qualidade de vida àqueles que são os seres mais puros que existem. Vibramos a cada vitória e choramos por cada perda (geralmente escondidinhos no banheiro da clínica entre um atendimento e outro).

Infelizmente, também lidamos com muitos casos de negligência e maus-tratos. Além disso lidamos (com mais frequência do que gostaríamos) com dedos apontados em nossa cara, com gritos e desaforos, exigindo que não cobremos por nossos serviços porque “UÉ, VOCÊS NÃO AMAM OS ANIMAIS???”.

Entendemos que muitas das vezes essas palavras são proferidas em momentos de desespero de um tutor sem condições de arcar com o tratamento de um pet, mas também somos pessoas comuns, que como todas as outras, têm contas a pagar, uma família para sustentar, sonhos para realizar e sentimentos que são atravessados por tais atos.

Amamos os animais. Amamos tanto que dedicamos toda a nossa vida em nos qualificarmos para entregar o melhor para eles. Perdemos noites de sono e eventualmente nossa saúde nesse caminho. E ainda assim, pouco reconhecimento chega até nossa classe. É quando bate o desânimo. É quando o burnout e a depressão chegam. A exaustão física e mental que leva milhares de médicos veterinários a tirarem a própria vida todos os anos, sendo infelizmente a profissão com a maior taxa de suicídios.

Eu mesma tive depressão e temi pela minha vida em um período que sinto calafrios de sequer lembrar. Quem me vê hoje, finalmente feliz e realizada com o meu ofício (e missão de vida), sequer imagina o longo caminho que percorri até aqui, com a ajuda de familiares, amigos, terapia e psicotrópicos. Tive a oportunidade de me reerguer, mas infelizmente muitos colegas se vão e é duro demais lidar com essa realidade.

Se hoje o animalzinho é um membro importante da família, aquele que cuida dele também deve ser reconhecido. Entendo que às vezes, mesmo que haja vontade de garantir a saúde do bichinho, o dinheiro falta, ainda mais no cenário econômico atual. Mas felizmente hoje contamos com um hospital veterinário público em Belém, que ajuda e muito a tratar daqueles em situação de maior vulnerabilidade econômica. Muito ainda falta em termos de políticas públicas voltadas aos animais, mas hoje já encontramos um cenário menos desanimador que há alguns anos atrás.

Deixo aqui o meu MUITO OBRIGADA a todos os companheiros de caminhada. A todos os colegas de profissão que buscam se ajudar. A todos os tutores de pacientes que nos tratam com carinho. A todos os bichinhos que tanto nos ensinam todos os dias. Que eu tenha a oportunidade de, ainda nesta vida, ver minha profissão ser tratada com a dignidade que merece.

Luana Vasconcelos – Médica Veterinária