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Tembés negam acusações da BBF e apontam tentativa de criminalização contra a comunidade

Segundo informe da empresa Brasil BioFuels (BBF), um grupo de indígenas da etnia Tembé teria invadido uma área privada da companhia localizada em Tomé-Açu, no nordeste paraense. A ação teria ocorrido no final da tarde da última terça-feira, 27, e a nota alega que um funcionário da empresa teria sido agredido pelos indígenas com um tiro no pé, além de ter seu corpo incendiado pelos supostos invasores.

A empresa relata que já havia registrado boletins de ocorrência por conta de ameaças de invasões anteriores a propriedades privadas da BBF e afirma que, cerca de 15 dias atrás, os indígenas teriam, de fato, invadido fazendas e o polo da BBF na cidade, com uso de caminhonetes e armas de fogo.

Sobre o caso mais recente, as informações seriam de que o funcionário agredido teve 60% de seu corpo acometido por queimaduras de segundo grau e foi transferido para um hospital da capital, onde segue internado. Segundo um porta-voz da empresa, as providências legais já foram tomadas e eles seguem o aguardo da atuação das autoridades.

Porém, os Tembé afirmam que a história é bem diferente. Após a série de acusações, o advogado do grupo indígena divulgou uma nota de esclarecimento na qual os Tembé negam a autoria dos ataques e afirmam que apenas buscam os direitos como um dos povos originários da região, sempre conforme a lei.

Segundo eles, a empresa BBF mantém conflitos com várias etnias do entorno de suas instalações e que o acirramento de tais disputas pode ter levado ao caso em questão, além de reforçar que o ocorrido teria tido lugar a mais de 100 quilômetros das ocupações Tembé.

Eles ainda acusam a BBF de tentativas de criminalizar lideranças indígenas com falsas ocorrências de crimes, a fim de enfraquecer a resistência de povos tradicionais na região e pedem que as autoridades apurem o que vem acontecendo no entorno da empresa.

Confirma a nota completa:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

A Associação Indígena Tembé do Vale do Acará (AITVA), Associação de Moradores Agricultores Quilombolas da Comunidade Quilombola Nova Betel – (AMAQCNB) e a Associação de Moradores e Agricultores Remanescentes Quilombolas Do Alto Acará – (AMARQUALTA), vem a público se manifestar sobre os fatos ocorridos nos dias 23, 27 e 28 de dezembro de 2022, em especial às supostas agressões sofridas por um dos funcionários da empresa BBF nas extremidades da fazenda NIPAC.

Informamos que, do contrário ao que tem sido veiculado pelas redes sociais, grupos de Whatsapp e até mesmo em Boletins de Ocorrência policial, as comunidades indígenas Tembé, de Tomé-Açu nada tem a ver com os supostos atos de violência contra trabalhadores da empresa BBF, em especial ao caso em que um deles chegou a ser supostamente atingido por tiro e queimaduras.

Esclarece que a luta do Movimento Indígena, Quilombola e Ribeirinho (IQR), tem como principal fundamento legítimo a busca pela garantia de direitos originários que entendemos terem sido violados há tempos, desde a implementação da monocultura de Dendê aos redores e até mesmo dentro de nossos territórios tradicionais.

Tais direitos violados consistem em inobservância do direito à Consulta Prévia, Livre e Informada, introduzida ao nosso ordenamento jurídico através da Convenção 169 da OIT, bem como, a falta de realização de estudo de componente indígena e quilombola e a inobservância da zona de amortecimento entre o empreendimento e as comunidades.

O acirramento do conflito tem persistido há mais de um ano e uma das principais problemáticas que vem assolando nossa vivência tradicional tem sido a persistente tentativa de criminalização das nossas lideranças por parte da Empresa com notícias e ocorrências falsas que vinculam ao nosso movimento em ações supostamente criminosas.

Cabe esclarecer que no Vale do Acará há outras comunidades que não são do povo Tembé, que também tem conflitos territoriais e agrários com a BBF, neste sentido, há uma grande possibilidade de que o fato conflituoso que resultou supostamente em uma pessoa ferida tenha ocorrido em um desses pontos de conflito, haja vista que a violência narrada aconteceu a cerca de 100 quilômetros das áreas de ocupação tradicional do povo Tembé.

Sublinhamos a necessidade de que as causas que deram ensejo ao conflito ocorrido nos dias 27 e 28/12/2022, a cerca de 100 quilômetros de distância das nossas ocupações tradicionais, sejam devidamente apuradas pelos órgãos competentes, pois, tomamos conhecimento de que o mesmo foi grave, havendo feridos da empresa BBF e também de moradores daquela comunidade.

Preocupa-nos o fato de que nestas situações a empresa BBF ficar expondo seus funcionários, colocando-os em perigo de vida ao utilizá-los como soldados de guerra. Neste sentido, prestamos também nossa solidariedade aos funcionários da empresa, principalmente ao funcionário que teve queimaduras pelo corpo, ratificando, portanto, que as Comunidades Indígenas da Etnia Tembé de Tomé-Açu em nada contribuiram para tal conflito, sequer sabíamos de tal conflito na região da fazenda Nipac.

Logo, solicitamos aos órgãos públicos competentes, que sejam adotadas as medidas necessárias para a apuração real dos fatos e, às mídias e à imprensa, que sejam mais responsáveis em suas reportagens quando forem retratar o atual conflito existe no Vale do Acará, buscando ser mais imparcial, e apurando melhor os fatos.

Por fim, afirmamos que é também de nosso interesse que tais fatos sejam esclarecidos pelas autoridades competentes, evitando as especulações criadas pela empresa BBF em procedimentos policiais, inclusive tentando criminalizar lideranças Tembé por situações alheias ao seu território.

As denunciações caluniosas, imputando crimes inverídicos a lideranças Tembés tem sido uma pratica constante da empresa BBF, com a intenção de criminalizar e difamar a nossa luta por nossos direitos. Nossa luta é de cunho territorial em defesa do nosso território e não deve ser confundido com outros movimentos, eis que, nos últimos meses, nossas lideranças estão fazendo grande esforço junto ao Ministério Público Agrário, por determinação de um processo judicial, de buscar meios para resolver o conflito com a empresa de maneira consensual e pacífica, e com este esforço tem tentado manter o diálogo.

Tomé-Açu, 28 de dezembro de 2022.