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Psicopedagoga explica como escolas devem se estruturar para atender alunos neurodivergentes

Nas últimas semanas, o BT recebeu denúncias de maus tratos à crianças em escolas de Belém, sobretudo crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA). O que acendeu o alerta para a realidade e a sociedade que recebe esse público. Os estudos e meios de atendimento e tratamento voltados para crianças e adolescentes neurodiversas, que além do autismo, também inclui o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), que vem ganhando força cada vez mais.

Para aprofundar esse tema, conversamos com especialistas nesse campo que se dedicam a promover uma qualidade de vida para essas pessoas, a partir do acesso mais amplo ao diagnóstico, e que deve ser acompanhado de políticas e novos comportamentos para com os neurodiversos.

Logo, é de fundamental relevância conhecer mais sobre e aprender a melhor forma de convivência que a sociedade deve adotar para interagir e acolher esse público, em especial, crianças e adolescentes que estão em fase de desenvolvimento dentro do contexto pessoal e social.

Para a psicopedagoga Natália Dourado, especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional e Análise do Comportamento e Desenvolvimento Infantil, que em inglês significa Applied Behavior Analysis (ABA) as escolas precisam de profissionais capacitados para atender essas crianças e adolescentes em formação.

“O ideal seria as escolas terem profissionais capacitados e um setor que possa acolher esses alunos. E nesse setor pode ter uma equipe com psicólogo, assistente social, fonoaudiólogo, psicopedagogo, por exemplo. E essa equipe deve acolher a criança e receber o laudo médico e identificar as necessidades dela. São crianças neurodiversas, então são diversos os transtornos. Por exemplo, o autismo, ele tem níveis 1, 2 e 3. Cada autista tem um nível de suporte. Dentro dessa avaliação infantil, a equipe de profissionais vai identificar o suporte que essa criança precisa. Por exemplo, o nível 1 pode ser uma criança que tem dificuldade na interação social, então o suporte que ela vai receber será em habilidades sociais. A criança que está no grau três, que é mais severo, vai precisar do auxílio de um mediador e até de materiais e ambientes adaptados, uma estrutura diferenciada. Então, por isso a escola precisa se preparar para esses cenários de graus diferentes de transtornos. E nesse sentido, a capacitação é a estratégia, entendendo o que o aluno precisa e a escola deve se adequar”, explicou a especialista.

Psicopedagoga Natália Dourado. Imagem: Reprodução.

A lei Berenice Piana, de dezembro de 2012, ampara e estabelece políticas e diretrizes para o atendimento e assistência especializada para a proteção dos direitos da pessoa com autismo. “É importante ressaltar que alguns autistas precisam de um ensino mais estruturado. Por isso, a importância do profissional ser capacitado em Análise do Comportamento Aplicada ao Autismo (ACAA), além das leis que protegem o direito deles, como a Berenice Piana. Esse profissional de ACAA pode aplicar as técnicas de ensino em todos os ambientes, como casa, escola, e o ambiente natural do indivíduo. Todas as necessidades dos alunos devem constar no PEI – Plano de Ensino Individualizado, na escola onde ele estudar”, disse Dourado.

Com relação ao TDAH, o atendimento especializado e atenção de profissionais capacitados também é crucial, segundo Natália: ” O aluno com TDAH pode precisar de um olhar diferenciado do próprio professor, como talvez, ter que sentar na frente da sala. Esse professor também pode preparar um material de ensino diferente para esse aluno, com redução de texto, redução de conteúdo, redução de alternativas na prova. Ou seja, o melhor modelo de ensino para essas crianças com estes diagnósticos é adaptar de acordo com as necessidades delas. Por exemplo, algo mais visual, mais lúdico, algo mais objetivo. Isso auxilia muito e facilita, mas tudo depende da avaliação. Tem criança que é mais visual, outras são mais sensoriais, enquanto que outras se adaptam mais ao vídeo. Então vai depender muito da criança e da avaliação dela. A metodologia tradicional não facilita. E a estratégia é adaptar, colocar imagens, ser mais dinâmico, para trazer o interesse da criança e o tempo que o professor tem para trabalhar com a criança”, detalhou a psicopedagoga.

Acerca do ensino para pessoas autistas, segundo a educadora, cada autista possui o seu perfil e deve-se aplicar uma avaliação para definir uma forma para desenvolver o ensino e aprendizado. “Não é uma receita de bolo. O educador deve conhecer o aluno para desenvolver a melhor metodologia para o autista”, acrescentou.

A análise do comportamento aplicada é uma ciência chamada no termo inglês de Applied Behavior Analysis.

CRESCIMENTO DE DIAGNÓSTICOS

Estudos recentes apontam o crescimento de casos de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), como o da Jama Pediatrics, que indica a prevalência de casos entre crianças e adolescentes, como nos Estados Unidos de 1 para cada 30 crianças e adolescentes entre 3 e 17 anos naquele país, com dados de 2019 e 2020. No Reino Unido, uma pesquisa publicada em agosto de 2021 sugeriu que os números cresceram espantosos 787%, entre 1998 e 2018. No Brasil, pesquisas indicam que uma a cada cinco pessoas podem ter o diagnóstico de autismo.

De acordo com a psicopedagoga, o diagnóstico destes transtornos como autismo e TDAH sempre existiram, e com o avanço da ciência, a escala desses diagnósticos cresceu. “Esses casos são genéticos e sempre existiram. O avanço da ciência permitiu o surgimento de diagnósticos mais precoces. Antigamente, os diagnósticos eram tardios. Eu acredito que é uma nova realidade e que as pessoas estão em busca dos seus diagnósticos. Pessoas que passaram muitos anos se vendo de forma diferente e sofreram por isso, hoje, chegou essa oportunidade delas entenderem por que são diferentes. Então é uma pauta muito atual porque o avanço da ciência e da medicina permitiram essas avaliações e também a capacitação desses profissionais da saúde, em que o diagnóstico das crianças sai bem cedo, com dois, três anos de idade”, avalia Dourado.

Nesse caminho de desenvolvimento da medicina e diagnósticos, a descoberta mais cedo permite maior tempo de cuidado e início do tratamento logo nos primeiros anos de vida da criança. Diretamente relacionado a esse novo cenário, os casos mais graves de autismo tiveram uma substancial redução, justamente pelo avanço e acesso aos diagnósticos. E nessa mesma linha, os graus leves de autismo cresceram impulsionados também pelo avanço do diagnóstico.

CONTATO E SOCIALIZAÇÃO

A especialista acrescenta ao tema a preocupação de pais de crianças que não possuem o transtorno e que interagem e socializam com crianças e adolescentes neuro diversos. “Aos pais que querem separar seus filhos de crianças neurodiversas, a forma de propor esse inclusão é através da conscientização desses pais, falando sobre o tema. Porque crianças autistas são diferentes, nem todas tem as mesmas características por conta do grau de autismo em cada uma. Sabemos que algumas crianças autistas podem machucar, mas temos que entender o motivo. Às vezes, é porque elas não conseguem se comunicar. Então, se elas forem educadas a como se comportar elas podem reduzir e até abandonar essa prática de machucar. Elas precisam ter a oportunidade de aprender para modificar esse comportamento por mais que elas se machuquem. Elas precisam ter a oportunidade de aprender que machucar não é correto. A única forma de mudar esse pensamento de alguns pais é promover o acesso e a informação a respeito do transtorno. E os pais entendendo, podem ajudar mais e perder o preconceito”, finalizou.

LEIS

Separamos algumas leis que amparam e protegem as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Brasil:

Lei 12.764/2012: instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista

Decreto 8.368: que regula a lei 12.764/2012.

Lei 13.145/2015: Lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência.

Lei 13.977/2020: Política estadual de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (PEPTEA).