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Ilha no Pará desaparece em função da navegação ilegal, aponta laudo; entenda

A Polícia Civil do Pará recebeu denúncias de pescadores e ribeirinhos, e indiciou uma empresa pelo completo desaparecimento da Ilha Camará, na Reserva Extrativista (Resex) Marinha Mestre Lucindo, em Marapanim, na região costeira conhecida como salgado paraense, a cerca de 165 quilômetros da capital Belém. A ilha tinha dimensões de aproximadamente 13 campos de futebol.

Ilha desaparece no Pará pela navegação ilegal.

EROSÃO PELA PRATICAGEM DE LANCHAS

A Polícia entrou em contato com a Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), que elaborou um laudo científico, feito em 2023, e apontou que o sumiço da ilha foi ocasionado por erosão pela constante passagem de lanchas de praticagem, atividade definida na marinha mercante de orientar navios cargueiros em alta velocidade, ao longo do rio Cajutuba, onde a ilha estava localizada e desapareceu. A ilha foi se decompondo até submergir.

Ou seja, ação humana, uma vez que a área era usada como rota pela empresa indiciada, configurando crime ambiental, pois a empresa não teria licença exigida em casos dessa natureza. O inquérito está agora nas mãos da Justiça que se debruça no caso.

Laudo produzido pela UFRA mostra área geográfica onde existia a ilha.

Os pesquisadores afirmam que não há registros fotográficos da ilha, apenas imagens de satélite, coletadas desde 1980, aliado a relatos de comunidades locais.

O LAUDO DA ILHA

O auxílio à investigação veio a partir de uma extensa análise cartográfica, com o apoio de geoprocessamento e análise de imagens de satélite, trabalho realizado pela professora Tabilla Verena da Silva Leite, docente do curso de Engenharia Cartográfica e Agrimensura da universidade. A professora, que há anos pesquisa dados sobre a zona costeira paraense reuniu dados que vão de 1985, momento em que se tem as primeiras imagens de satélite da ilha, até 2021, data da solicitação da Polícia Civil. As imagens analisadas pela pesquisadora comprovam o desaparecimento total da ilha Camará, que na década de 80 possuía uma área de 13.561,998 m² e em 2016 não aparecia mais no mapa. “A ilha sempre aparecia nas imagens de satélite. Observou-se que havia existência vegetação e solo e os moradores afirmam a existência animais. Ela fornecia vários serviços ecossistêmicos para as comunidades do entorno, que a usavam também para atividades recreativas e lazer”, diz.

A professora explica que as ilhas localizadas no município de Marapanim, assim como na zona costeira paraense, em sua maioria pertencem à tipologia de uma ilha costeira do tipo fluviomarítima, onde se destacam ilhas de sedimentação e de erosão. “O processo de erosão é natural e ocorre muito na Amazônia, por conta do solo arenoso e do litoral ser baixo. A erosão costeira é provocada principalmente pela ação das águas do mar, que atuam sobre os materiais do litoral, na linha de costa, modificando o solo através da sua ação química e da sua ação mecânica, como o impacto das ondas, por exemplo. Por isso, na área costeira paraense é natural que ilhas apareçam e desapareçam, devido a influência das marés, dos sedimentos e dos rios amazônicos”, diz.

E completa: “Nessa ilha em específico alguma ação antrópica acelerou esse processo”, explica a pesquisadora. Como parâmetro de investigação, foi observada e comparada uma outra ilha próxima, parecida em tamanho, solo e localização geográfica, mas em outro braço de rio. Comparada a ilha Camará, a outra ilha observada sofreu pouca alteração. “Essa outra ilha não era rota das embarcações da praticagem e a ilha Camará sim. A outra ilha não sofre o impacto das ondas dos barcos”, explica. Segundo o parecer técnico emitido pela pesquisadora, a ilha Camará teria começado a desaparecer a partir do ano de 2003, quando já tinha somente 8.100,46 m². Esse sumiço foi ficando mais claro e intenso no ano/intervalo de 2012, quando a ilha alcançou uma área de 5.400,147 m² e 2013 com área de 5.399,79 m². Em 2015 a área chegou a 2.697,863 m², até o completo desaparecimento no ano de 2016.

Laudo mostra antes e depois, com o sumiço da ilha.

OUTROS IMPACTOS

Outro estudo feito por pesquisadores, desta vez, da Universidade Federal do Pará (UFPA), aponta que além do sumiço da ilha, cinco impactos causados pela atividade de praticagem das lanchas, também identificados.

Erosão; naufrágio de barcos pequenos com riscos de morte; destruição de redes de pesca; mudanças na vida marinha; impactos diretos no modo de vida das comunidades de pescadores e ribeirinhos da região;

Não havia registros de moradia na Ilha Camará, mas ela era usada para atividades como lazer e pesca, conforme os relatos dos moradores da região para a polícia. A área é composta de manguezais que são ricos em biodiversidade e importantes para o ecossistema amazônico.

A RESEX

A Resex Marinha Mestre Lucindo foi criada em 2014, depois que a empresa Barra do Pará já estava instalada na região. A área da reserva, de 26,4 mil hectares, tem 32 comunidades ribeirinhas, que vivem da pesca e da coleta artesanal. A gestão é federal, sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

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*Feito com informações de UFRA E G1 Pará.