O que descobrimos sobre o caso do peixe-serra que teria sido capturado do litoral paraense vai deixar você ainda mais revoltado! Por que os responsáveis ainda não foram identificados?
Esta semana ficamos embrulhados com um vídeo que mostra um peixe-serra, espécie criticamente ameaçada de extinção, capturado por uma embarcação. Um grupo de pescadores corta a catana do animal com golpes brutais. O peixe continua vivo, e um dos pescadores sugere “agora precisa cortar ele no meio em dois pedaços”.
André Trigueiro, jornalista, postou o vídeo nas redes sociais, o que causou revolta em artistas e famosos como Padre Fábio de Melo e a atriz Mariana Xavier.
Numa busca rápida no Google, inúmeras páginas de proteção dos animais e entidades de conservação aparecem compartilhando o vídeo, citando o Pará como provável localidade do ocorrido e marcando o Ibama nas postagens.
Diante da repercussão das imagens, com os responsáveis aparecendo, com indicativo da localidade, e por se tratar de uma espécie que já desapareceu em dezenas de países no mundo, imagina-se que essa combinação de elementos seria o suficiente para o Ibama abrir uma investigação.
Mas pra nossa surpresa, quando entramos em contato com o órgão, ninguém sabia de nada, mesmo com tantas marcações nas redes sociais. Isso foi dito via ligação telefônica, que eu mesma atendi no meu celular depois de procurá-los. Solicitei então uma nota oficial, mas até agora não tivemos nenhuma resposta por escrito.
Pra quem não sabe o Ibama é um órgão federal, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e tem responsabilidade pela execução da Política Nacional do Meio Ambiente. Inclusive, importante ressaltar, o Ibama pode exercer poder de polícia ambiental.
Mas se o Ibama não sabe, quem poderia saber?
Por se tratar de um crime ambiental, com tanta gente apontando o Pará como local do evento, a Polícia Civil já está investigando. Ledo engano. No último domingo (17), quando subimos a matéria aqui no portal, entramos em contato com a assessoria da polícia, antes mesmo de falar com o Ibama. O órgão respondeu não ter registro, e que provavelmente o vídeo não é no Pará. Ainda complementam dizendo que não se trata de um peixe-serra e sim de um “espadarte”.
Certamente a área técnica desconhece que “espadarte” é o nome popular para o peixe-serra, e que recebe este nome justamente por sua serra se parecer com uma espada.
No mesmo dia 17, a nossa equipe de plantão falou com a Semas, Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade, e mandou o link com o vídeo no instagram. No dia 20, quando eu mesma entrei em contato cobrando a investigação, segundo a assessora a Semas ainda não tinha uma denuncia oficial.
Como assim não tem denuncia oficial? Mas e o vídeo? Então eu perguntei se o vídeo não era o suficiente e a assessoria disse que ainda não tinha visto o vídeo que havíamos enviado pelo whatsapp desde o dia 17.
O que não sabem o Ibama, a Delegacia de Meio Ambiente e a Semas, mas uma fonte anônima nos informou, é que o crime muito provavelmente aconteceu na região de Bragança. Em vista dessa informação, entramos em contato com a Secretaria de Meio Ambiente do município, região da 2a maior cadeia produtiva de pesca do estado.
Segundo o chefe do setor de fiscalização, eles não receberam nenhuma denúncia oficial, então eu perguntei se ele tinha visto o vídeo. Ele respondeu que sim, mas não lembrava de ter reconhecido ninguém de cabeça. Questionei o que seria preciso para abrir uma investigação, então ele me informou que o procedimento é preencher um formulário.
Ninguém sabe. Ninguém viu.
Diante da negativa em todos os órgãos responsáveis ocorre um imediato questionamento: quantos crimes ambientais acontecem nessa extensão Amazônica do Pará e que nunca serão apurados porque ninguém preencheu um formulário?
Quantos formulários precisam ser preenchidos e quantas espécies da fauna precisarão entrar em extinção para que um órgão seja eficiente em sua função de proteger a Amazônia?
Bem, na falta de formulário preenchido, a equipe do Belém Trânsito foi atrás e encontrou um barco muito semelhante, com as mesmas características do barco onde aconteceu o trágico episódio com o peixe-serra, na página do Facebook “barcos e traineiras de pesca 2”, com legenda que identifica o barco em Bragança.
Não podemos afirmar que é. Mas será que essa semelhança é mera coincidência e merece investigação ou precisamos primeiro preencher um formulário?
Agora, você quer saber pra onde vai a catana do peixe-serra? Entenda por que a catana desse animal em extinção pode ser tão lucrativa. Você vai ficar ainda mais revoltado!
Segundo o professor e Doutor em biologia marinha, Tommaso Giarrizzo, os dentes cravejados no “bico” do peixe-serra podem render dólares quando viram esporas em lutas de galos que acontecem em países da América do Sul, como Equador e Peru.
Como funciona? Nas patas do galo é amarrado um esporão para que ele possa matar o outro galo. Os apostadores pagam pra ver quem será o mais forte. Armar o galo “até os dentes do peixe-serra” faz parte do espetáculo.
Ainda segundo o professor Tommaso o peixe-serra não é mais encontrado no Brasil há alguns anos e a única região onde há registro de incidência do animal é no litoral do Norte. “Esses animais estão em extinção no mundo todo e o único lugar do Brasil onde ainda encontramos é Pará, Amapá e Maranhão”, afirma o professor.
Outro ponto importante que o pesquisador destaca é que a catana tem mais valor econômico, mas as outras partes do animal também são comercializadas. “Dependendo do espaço na embarcação, eles usam todo o peixe, pegando as barbatanas assim como a carne, que é muito apreciada”, afirma o pesquisador.
Nas imagens, podemos ver que não trata-se de um barco pequeno, mas sim de uma pesca comercial. Segundo inúmeros pesquisadores da dinâmica pesqueira na região Bragantina, há um crescimento desordenado da pesca industrial e artesanal em larga escala, fomentados por uma política pública governamental que visa estritamente aumentar a capacidade das frotas. Com maiores redes de pesca e estrutura mais robusta, é impossível não tirar do mar, junto com piramutaba, douradas e pargos, espécies ameaçadas de extinção.
É assim que funciona a sobrepesca. Se por um lado o estímulo governamental à atividade pesqueira gera mais emprego e renda, por outro, sem planejamento, gera um desequilíbrio ambiental dramático.
Um ícone da vida marinha
Acreditem, esse peixe icônico sumiu de 90 países. No Brasil, atualmente, alguns exemplares de pristis pristis, que é o nome científico do peixe-serra, ainda são encontrados no Norte do país, especialmente na costa oriental da Amazônia
A espécie, embora tenha nome de peixe, na verdade faz parte da família das raias, que são os peixes cartilaginosos mais ameaçados de extinção do planeta.
O peixe-serra pode atingir até 7 metros e apesar do seu grande porte, é mais uma espécie que caminha para a extinção por conta da sobrepesca, que é justamente o que vimos acontecer na imagem de crime ambiental que chocou as redes sociais.