///////

Em Barcarena, famílias da bacia do Rio Pará estão há cinco anos sem receber indenização por danos ambientais

O BT recebeu o apelo das cerca de 30 mil famílias que vivem ao redor da Bacia Hidrográfica do Rio Pará, em Barcarena, que é palco de frequentes desastres ambientais provocados por empresas internacionais que retiram matéria prima da Amazônia e prejudicam a qualidade de vida das famílias e comunidades que vivem da floresta. Floresta essa que é fonte de sustento na região, especialmente os rios Pará e Murucupi. Desde 2018, ano do mais recente desastre ambiental da empresa Hydro/Alunorte que despejou bauxita na natureza, os itens pactuados no acordo do Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público Federal favoráveis às famílias seguem se arrastando, e as comunidades padecem.

O Rio Murucupi, poluído com metais como o alumínio, chumbo e níquel, contamina os peixes, a caça, o solo, lençol freático, as plantas e árvores, impactando a produção do pequeno agricultor, impossibilitando o cultivo da macaxeira, do caju, da banana, do açaí, murici, abacaxi, fava, abóbora e do milho, além de contaminar a população que consome estes alimentos. O mesmo atinge e enfraquece o rio Pará.

Rio Pará, em Barcarena. Imagem: Reprodução.

“As famílias atingidas pelos impactos ambientais do despejo de bauxita da Hydro seguem há cinco anos sem receber a indenização de cerca de 37 milhões que será revestida em benefício das 30 mil famílias que vivem aqui. Fez cinco anos agora dia 17 de fevereiro e nada anda. Nosso rio está contaminado. Peixes contaminados. Muitos estão morrendo com metal no sangue, são cerca de 300 pessoas com laudos. Não tem médico para tratar as pessoas. Essas indenizações são para pagar essas coisas, é para a saúde da nossa gente. Tem gente morrendo aqui. E as empresas são negacionistas, dizem que não cometeram crime ambiental nenhum, mesmo com provas”, contou ao BT Jorge Paulo, do Instituto dos Ribeirinhos do Pará (IRPA).

Ainda nesse sentido, segundo a IRPA, os pontos do TAC favoráveis à empresa, como selos e licenças ambientais para permitir o funcionamento das atividades na região já foram todos resolvidos. Enquanto que, por outro lado, os trabalhos de estudo para verificar o grau de impacto na natureza e na qualidade de vida das comunidades segue travado, assim como o repasse dos valores de indenizações e multas, que se encontram sem perspectivas de resolução.

Barragem de rejeitos da Hydro/Alunorte. Imagem: Reprodução.

“O nosso lado é obscuro (das comunidades), nada foi feito. As indenizações, as multas a serem pagas para melhorar as coisas para a nossa gente, nada anda. Sofremos com as contaminações e o envenenamento da água, dos peixes, são muitas mazelas. O Ministério Público Federal disse que primeiro não apareceu empresa especializada para realizar o estudo de impacto. Agora já disse que duas empresas apareceram, mas nada ainda concreto aconteceu. A Semas diz que também está buscando uma empresa para aplicar os 43 milhões de indenização em benefício nosso. O plano que a Hydro deveria apresentar para a recuperação da área e meio ambiente também segue parado. O acertado seria um salário mínimo por mês mais a indenização”, explicou Paulo.

Em 2018, a justiça de Barcarena decidiu que a multinacional norueguesa deveria pagar R$ 150 milhões de indenização como consequência dos danos ambientais provocados na cidade. Porém, não foi feito e a multa chegou a R$ 500 milhões.

O BT entrou em contato com o Ministério Público Federal, Ministério Público do Pará, Governo do Pará e a Hydro/Alunorte e Semas e aguarda um retorno sobre o assunto.

Em resposta ao nosso contato, o MPF disse que um edital está em fase de elaboração e vai reger a seleção pública de organizações da sociedade civil para fazer a gestão de recursos que devem ser repassados a projetos de comunidades localizadas nas áreas abrangidas pelo TAC. Veja a nota completa abaixo

Confira a nota de repúdio da IRPA:

“Os Movimentos Sociais Representativos da Sociedade Civil de Barcarena, Abaetetuba e Comunidades Adjacentes Impactadas por Danos Ambientais, à Saúde Humana, Danos Sociais, Econômicos e a Segurança Alimentar De Pessoas e Famílias Tradicionais Impactadas vem em público repudiar a forma como os órgãos e instituições de justiça e governamentais vem tratando o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta – TAC do caso do desastre ambiental das empresas Hydro/Alunorte de 2018, onde todos os itens do TAC que favorecem as empresas Hydro/Alunorte já foram cumpridos, porém os demais itens que poderiam favorecer às comunidades impactadas da bacia hidrográfica do Rio Pará até ao momento hoje, dia 17 de fevereiro de 2023, data que completam 5 anos do desastre, nenhum item do TAC favorecendo a sociedade civil impactada foi cumprido. PESAR por centenas de Mortos com Doenças provenientes da poluição e contaminação Ambiental e hoje, mas de 300 PESSOAS com Laudos que comprovam a contaminação por metais pesados no sangue. REPUDIAMOS a forma como este TAC vem sendo conduzido pelos signatários, priorizando as Empresas Hydro/Alunorte (o capital) e desprezando a vida de pessoas doentes, e todas as pessoas e famílias tradicionais impactadas. Hoje, 17 de fevereiro, para nós é uma Data Amarga e a enfadonha espera por justiça continua”.

Confira a nota do Ministério Público Federal (MPF) na íntegra:

“Esses temas foram tratados na reunião de 31 de janeiro deste ano do Comitê de Acompanhamento (CA) da execução do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado entre Hydro, Alunorte, MPF, MPPA e Semas (fazem parte do CA as partes signatárias, membros da prefeitura de Barcarena, representantes do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas do Município de Barcarena e representantes da sociedade civil distribuídos em dez representações). As informações divulgadas pelo CA são as seguintes: Os valores das multas pagas pela Hydro e depositados no Fundo Estadual de Meio Ambiente (Fema), conforme previsto na cláusula sexta do TAC, já somam mais de R$ 41 milhões. O Fema é gerenciado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), mas os recursos, especificamente oriundos do TAC, vão ter gestão descentralizada para financiar projetos comunitários locais, atendendo às sugestões da sociedade civil que participa do Comitê de Acompanhamento do TAC. Após uma extensa agenda de trabalho, ao longo de 2022, envolvendo sociedade civil, Semas e Procuradoria-Geral do Estado do Pará (PGE), um edital está em fase de elaboração e vai reger a seleção pública de organizações da sociedade civil para fazer a gestão de recursos que devem ser repassados a projetos de comunidades localizadas nas áreas abrangidas pelo TAC. A procuradora Fernanda Sequeira, titular da Procuradoria Fundiária, Ambiental, Minerária e Imobiliária do Pará, e o gerente de licenciamento da Semas, Marcelo Moreno, informaram que poderão ser selecionadas até cinco organizações da sociedade civil para fazer a gestão da primeira parte dos recursos. O restante do valor será aplicado novamente em projetos comunitários, após avaliação da primeira parte de execução. “A iniciativa de descentralizar recursos de um fundo como o Fema é pioneira no Brasil e pode ter acertos e erros, por isso precisa ser constantemente acompanhada e avaliada”, destacou a procuradora Sequeira. O representante da Hydro no CA, Eduardo Bustamante, apresentou um plano de acompanhamento da execução das auditorias independentes. De acordo com o plano, já aprovado entre os signatários, os membros do Comitê de Acompanhamento do TAC poderão acompanhar as auditorias em três etapas: no início, a empresa contratada deverá se apresentar ao CA, expor o plano de trabalho a ser executado e tirar dúvidas; durante a auditoria, o acompanhamento será feito por meio de atualização em plataformas de comunicação do CA e do TAC, além de uma atividade presencial com o CA, que deverá ser proposta pela própria auditoria; e a etapa final, que corresponde à apresentação do relatório técnico final da auditoria. Além das informações acima, divulgadas pelo CA, o MPF destaca que, em cumprimento ao TAC, R$ 65 milhões foram pagos a 20,6 mil famílias em cartões alimentação. Além disso, o TAC proporciona a realização de estudos técnicos, auditorias e uma série de medidas relacionadas à segurança dos depósitos de resíduos sólidos, melhoria do processo produtivo e aprimoramento e execução do plano de ações emergenciais da empresa. Atualmente estão em andamento auditorias para atendimento da segurança e estabilidade dos depósitos de resíduos e para analisar o plano de atendimento a emergências”.

Confira a nota na íntegra da Hydro/Alunorte:

“A Hydro está comprometida em agir com responsabilidade, colocando saúde, segurança e meio ambiente sempre em primeiro lugar nas regiões onde opera. As atividades da Alunorte estão devidamente licenciadas e as operações da planta são monitoradas e auditadas pelas autoridades governamentais competentes e por empresas certificadoras independentes. A Hydro e a Alunorte apresentaram informações e estudos de terceiros à Justiça brasileira para confirmar que não houve transbordo dos depósitos de resíduos sólidos em 2018. Isso também foi confirmado por mais de 90 inspeções e auditorias. A Hydro e a Alunorte possuem um portfólio de projetos de investimento social na região de Barcarena, apoiando o desenvolvimento das comunidades onde atuam, empregando esforço contínuo para ser um bom vizinho e um parceiro relevante para a população local. Um exemplo desse compromisso é o Fundo de Sustentabilidade Hydro (FSH), associação que promove o desenvolvimento sustentável e apoia projetos comunitários em parceria com a sociedade local e vai investir R$ 100 milhões em 10 anos para o desenvolvimento sustentável de Barcarena. Por meio do diálogo e da atuação coletiva com nossos stakeholders, desenvolvemos diversos projetos e iniciativas sociais. Com o apoio do FSH, foi possível desenvolver projetos como a Iniciativa Barcarena Sustentável (IBS). O IBS é um movimento independente de pessoas e instituições que decidiram trabalhar juntas para transformar a realidade social de Barcarena. Ao promover um espaço colaborativo, envolvendo membros de universidades, empresas, comunidades, organizações civis e autoridades, para compartilhar preocupações, discutir e priorizar as principais necessidades de Barcarena. No Pará a Hydro implementou mais de 25 programas de desenvolvimento socioambiental beneficiando parcela significativa das comunidades onde atua, além disso contamos com a participação efetiva de mais de 700 voluntários envolvidos nessas ações e programas, que visam educação, crescimento econômico, trabalho decente, capacitação e fortalecimento de instituições”.

Confira a nota na íntegra da Procuradoria Geral do Estado:

“A Procuradoria Geral do Estado informa que os laudos estão em fase de conclusão, permitindo um diagnóstico real da situação ambiental. Reuniões estão sendo feitas junto às comunidades de Barcarena e Abaetetuba para que parte do valor constante do FEMA(Fundo Estadual de Meio Ambiente) seja aplicado em projetos construídos pelo Estado, com a participação das próprias comunidades. O procedimento é acompanhado pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual, Defensoria Pública Estadual e representantes das 77 comunidades representadas pelo Comitê de Acompanhamento do TAC”.

Confira a nota da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade:

“A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) está acompanhando de perto o cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e a implementação das auditorias previstas”.