No último sábado, cerca de 400 pessoas paralisaram o transporte de cargas no rio Tapajós. O ato marcou o 7º Grito Ancestral do povo Tupinambá realizado no território Tupinambá do Baixo Tapajós, reserva Tapajós-Arapiuns (PA), no oeste do Pará.
As manifestações iniciaram às 9h e seguiram até às 15h, onde os manifestantes e representantes dos povos, Tupinambá, Munduruku, Arapiun, Kumaruara, Jaraqui, Tapajó, Tapuia, Apiaka, Kayapó, e de comunidades ribeirinhas do baixo Tapajós e de Montanha e Mangabal, ocuparam o rio com 5 barcos e 15 bajaras (canoas) com cartazes, denunciando os impactos do corredor logístico do Arco Norte, cujo os comboios de balsas, portos e terminais têm afetado negativamente o rio e os habitantes locais.
Durante a manifestação pacifica, indígenas puderam subir nas balsas e comboios para divulgar a petição pelo fim do projeto da Ferrogrão. Atualmente, a aliança contra o projeto conta com 39 movimentos e organizações da sociedade civil.
Segundo a coordenadora do Conselho Indígena do baixo Tapajós Amazônia (CITUPI), Raquel Tupinambá, o protesto acontece como forma de alerta: “Estão nos impedindo de pescar e matando o Rio Tapajós para exportar soja para a China e para a Europa. Se a Ferrogrão for construída, a situação vai piorar ainda mais”, explica.
No final da manifestação, os indígenas denunciaram crimes ambientais por meio de um manifesto do rio Tapajós. “Minhas águas já mudaram de cor por causa do garimpo e estou cheio de mercúrio que envenena os peixes e os humanos que se alimentam do que eu ofereço. Minha querida Praia da Vera Paz, espaço sagrado dos meus povos originários e lugar de lazer de tantos santarenos, foi destruída pelo ferro e cimento dos silos de soja do porto da Cargill. Construído há 21 anos, sem licença e sem consulta, esse porto marca o início de um ciclo de destruição”, diz o texto.
Entenda os impactos da Ferrogrão
O projeto desenvolvido por demanda da Cargill e outras grandes tradings do agronegócio, EF-170, busca ampliar e escoar a produção de soja e milho do centro-oeste do Brasil, através do Rio Tapajós. Segundo estudos preliminares apresentados pelo Ministério dos Transportes, quase mil quilômetros de trilhos entre a Sinop (MT) e Miritituba (PA), aumentariam o volume da exportação de grãos pelo rio em mais de 6 vezes até 2049.
As lideranças indígenas e populações locais alegam além de não serem consultados sobre a obra, o projeto aumentará a navegabilidade e o trânsito no rio, o que implicará em mais áreas desmatadas e destruição dos rios, de extrema importância para as comunidades. “A Ferrogrão vai aumentar o desmatamento para produzir mais soja e vai também aumentar a destruição do rio porque querem escavar o seu leito e explodir os pedrais, que são espaços importantíssimos para nós. A ferrovia vai aumentar os impactos do corredor logístico que já nos afeta, e até agora não fomos consultados”, denuncia Raquel Tupinambá.
A liderança Kayapó e representante do Instituto Raoni (MT), Karanhin Metuktire, reforça que os povos indígenas devem ser respeitados. “O projeto da Ferrogrão ser prioridade de setores do Governo Federal é um exemplo de como nossos direitos continuam sendo ignorados. Querem construir essa ferrovia sem respeitar a nossa existência e os protocolos de consulta de cada povo, como manda a Convenção 169 da OIT. Cada território tem suas próprias regras e formas de decidir, e isso precisa ser respeitado”, declara.
A advogada da organização Terra de Direitos, Bruna Balbi, diz que o Governa deve realizar uma consulta prévia com urgência com os povos impactados pelo projeto, a fim de analisar os impactos do empreendimento. O corredor construído envolve mais de 40 portos de transporte de carga, a hidrovia do Rio tapajós e os passivos da BR-163, portanto, é de urgência analisar e respeitar o direito à consulta de todas as comunidades e povos afetados, conforme a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.