Depois de um extenso período chuvoso, finalmente o sol vai dando as caras. Eu teria todos os motivos pra comemorar essa virada no clima já que, além da rinite que não abandonava minha casa desde fevereiro, perdi a conta dos banhos de chuva involuntários que tomei por causa dos aguaceiros que teimavam em desabar na exata hora em que eu precisava sair de casa pro trabalho e do trabalho pra casa.
Mas, a despeito de toda alegria que o clima mais ameno traz, eu estou me sentindo mais preocupado do que feliz. É que o verão na região norte é fogo, literalmente: é nesta época, de calor intenso, que os bandidos que destroem a floresta ateiam fogo na mata para tentar transformar preciosos hectares de floresta em pasto.
Já sabemos que o governo federal é omisso em combater a destruição da floresta, até porque o aumento do pasto beneficia a criação de gado – e este setor é uma das bases de apoio do presidente. Só que enquanto o executivo cruzava os braços, pelo menos a natureza dava uma mão: nos meses chuvosos os alertas de queimada costumam dar uma arrefecida, subindo após a chegada do verão até o pico em agosto e setembro.
Bem, costumavam. É que em abril, mês que ainda é considerado inverno na região norte, os satélites do INPE registraram pela primeira vez mais uma área de alerta de queimadas superior a mil quilômetros quadrados: foram 1.012 km2, índices compatíveis com meses mais quentes, e totalmente fora da curva para esta época do ano.
Traduzindo estes dados para algo mais próximo da nossa realidade, os alertas de desmatamento da Amazônia em Abril correspondem ao tamanho de 138.957 campos de futebol padrão Fifa. É uma área grande o bastante para que fossem disputadas mais de 17 mil copas do mundo como a que ocorrerá no Catar no final do ano – aliás, se continuar do jeito que está, logo logo a Amazônia estará parecida com o país-sede da copa: sem floresta e sem direitos humanos.
Para vocês terem uma ideia, até o momento o número recorde de alertas de queimada da série histórica pertencia ao ano de 2021, quando em abril a área de alerta chegou a 580 km quadrados – ou seja, o aumento em relação ao mesmo período do ano passado foi de 74%, e olha que o levantamento do Inpe levou em consideração os dados coletados até 29 de abril – o número pode ser ainda maior.
Ainda segundo Inpe, que mede o desmatamento entre agosto de um ano até julho do ano seguinte, os alertas do período já chegaram a 5.070 quilômetros quadrados – um índice 5% maior que o do ano passado e que, até o momento, perde apenas para 2020 que registrou terríveis 5.680 quilômetros de alertas. Mas calma que, se depender do governo federal, tudo pode piorar e, eventualmente, até este recorde pode ser batido antes que o chefe do executivo deixe o poder.