Após mais de 10 anos de implementação do Processo Seletivo Especial para Indígenas e Quilombolas, a Universidade Federal do Pará (UFPA) continua a oferecer oportunidades para populações tradicionais no ensino superior. No entanto, mesmo com o aumento do número de vagas ofertadas, os desafios permanecem os mesmos. É o que mostra o livro “Indígenas e Quilombolas na UFPA: Trajetória e Memórias de Luta por Direitos”.
O livro retrata as vivências de estudantes indígenas e quilombolas no ambiente universitário, mostrando as hostilidades enfrentadas por esses alunos, muitas vezes marcadas por tensões étnicas, e os obstáculos na busca da educação formal, na luta coletiva por reconhecimento e direitos, além dos desafios do ensino remoto, impostos emergencialmente pela pandemia de Covid-19.
A obra é resultado do projeto “Diversidade Étnico-Racial no Ensino Superior”, que foi liderado pelos professores Almires Machado, Cristina Terezo, Jane Beltrão e Rosani Fernandes.
O livro foi financiado entre 2020 e 2023 pela UFPA, com apoio da Fundação Ford e da Climate and Land Use Alliance (CLUA ), organizações não governamentais voltadas para fins educacionais, científicos e de combate às mudanças climáticas.
O BT Amazônia conversou com a professora Cristina Terezo, do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, e ela destacou ter sido a primeira vez que a Clínica de Direitos Humanos da Amazônia (CIDHA) ofertou vagas para o Programa de Pós-graduação em Direito e Residência Clínica Jurídica, exclusivamente para indígenas e quilombolas, além de um professor visitante indígena, tornando-se uma das maiores ações de inclusão da UFPA. “A gente precisou comprar equipamentos para todos esses alunos, despachar esses equipamentos para as aldeias, para os quilombos e isso foi um desafio muito grande, mas, por outro lado, como o programa se tornou remoto, isso abriu a oportunidade para que a gente tivesse residentes clínicos jurídicos, indígenas e quilombolas do Brasil inteiro, de todas as regiões dentro da nossa clínica,” explicou Cristina Terezo.
As experiências desses estudantes se entrelaçam com suas histórias de militância e resistência em diferentes territórios étnicos, seja em aldeias, quilombos ou cidades marcadas pela presença indígena e quilombola.
Pricila Aroucha, do Quilombo “Os Paulos” (MA), descreveu sua participação na residência jurídica como um divisor de águas em sua formação. “Abriu portas que muitos e muitos anos foram fechadas para nós. Ocupar espaços, sobretudo no mundo acadêmico, é super importante, nos permite falar e escrever sobre nós por nós mesmos. A história que foi falada dos nossos, foram escritas por outros, é importante dar voz ao lugar de fala.”, defendeu.
Da mesma forma, José Ubiratan Sompré, indígena da etnia Xerente, compartilhou sua experiência em participar da construção da minuta do projeto de lei que institui a Política Nacional de Prevenção da Exposição ao Mercúrio. “Foi um momento importante onde pudemos discutir nossas preocupações com as graves consequências geradas pela contaminação por mercúrio que tem chegado às nossas aldeias através da nossa principal base alimentar que é os peixes, que uma vez contaminados causam doenças e danos irreversíveis e têm impactado as populações mais vulnerabilizadas, principalmente a nós povos indígenas na Amazônia.”, disse.
Todas essas histórias e muitos outros relatos estão no livro “Indígenas e Quilombolas na UFPA: trajetórias e memórias por luta de direitos”, disponível em formato PDF no link: Indígenas e quilombolas na UFPA trajetórias e memórias de lutas por direitos.pdf
Livro “Indígenas e quilombolas na UFPA”
(Matéria escrita por Lívia Leoni, estagiária da Clínica de Direitos Humanos da UFPA, sob supervisão de Patrícia Carvalho, coordenadora de jornalismo)