Relacionamento Abusivo. Nos últimos dias esse tem sido o assunto de várias publicações, especificamente depois do que aconteceu com um casal no Big Brother Brasil. Por que é importante falarmos disso?
Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), uma em cada três mulheres já sofreu violência física ou sexual, que na grande maioria das vezes é praticada pelo próprio parceiro. Nesse tipo de relação, a vítima é sempre é a mulher? Não. Contudo, muitos levantamentos apontam que em mais de 80% dos casos de relacionamento abusivo, as mulheres são as vítimas da violência.
Para caracterizar uma relação como abusiva é necessário identificar, ao menos, um destes tipos de violência: verbal, emocional, psicológica, física, sexual, financeira e tecnológica. Esta última se refere ao controle de senhas, acessos ao celular e redes sociais, controlando curtidas e comentários, por exemplo.
Frases que chamam a atenção: Você tem sorte por eu te amar, ninguém conseguiria; Como você vai conseguir viver sem mim?; Se confia em mim, não tem que ter medo de mostrar o celular; Não corta o cabelo, não acho legal; Não fica perto daquela amiga, não gosto dela.
Muitas vezes o abuso não vem tão exposto como nessas frases. E quem está envolvida na relação tem dificuldade para perceber a violência, especialmente se é mais sutil e não física.
Um relacionamento abusivo começa como qualquer outro. Com paixão, afeto, cuidado, envolvimento intenso. Inclusive, pode ser intenso até demais. Relações que evoluem muito rápido para um vínculo mais sério podem ser preocupantes. De forma geral, logo se percebe o controle e manipulação sobre a vítima. Um outro sinal importante é o afastamento da rede de apoio e contatos da vítima. A pessoa tende a se isolar. No início, por estar sob controle do abusador. Depois, por estar com vergonha e com dificuldade para romper o ciclo da violência.
O que é o ciclo da violência? A primeira pesquisadora a identificar esse ciclo e a entender que os agressores seguem um padrão de comportamento foi a psicóloga norte-americana Lenore E. Walker. As conclusões dela foram feitas na década de 1970, depois de entrevistar mais de 1.500 vítimas de violência doméstica. O ciclo foi descrito da seguinte forma:
• Construção das tensões: ocorrem o controle do comportamento, o isolamento da mulher, ofensas verbais e humilhações
• Explosão da violência: há agressão física, violência patrimonial, violência moral, violência sexual ou violência psicológica
• Lua de mel: o homem pede perdão, enche a mulher de promessas de mudança, há reconciliação e reconstrução do vínculo (Fonte: G1)
Este ciclo ajuda a entender o porquê é tão difícil romper e terminar um relacionamento abusivo. A violência é escalonada. A vítima é envolvida. Não existe um episódio de agressão física desde o início. A violência vai escalonando. E mais, existe um período de “arrependimento” e pedido de perdão. Nesse momento a vítima pode ser presenteada, inclusive com promessas. Promessas de mudança são comuns. Porém, em algum momento o ciclo volta à etapa inicial de construção de tensões.
Detalhe: quem está na relação não consegue perceber que ela é abusiva e o perigo que está correndo, principalmente no começo, quando a violência se apresenta de forma mais sutil. Logo, é essencial que amigos e familiares observem e ajudem a pessoa a sair com segurança desse ciclo, antes que o pior aconteça.
O que fazer? Se você identifica alguma amiga/familiar/conhecida nessa situação, mostre-se disponível para ajudar. Não precisa chegar falando abertamente sobre os perigos da relação, muita gente tem dificuldade para entender o que vive. Logo, você pode abordar de forma mais geral, tentando entender como a pessoa está, como se sente, como vai a relação dela. Deixe ela falar, para então você colocar que gostaria de ajudar. Nem sempre é fácil. Há muita coisa envolvida para além do ciclo da violência. Desde a cultura machista, patriarcado, as relações de poder, que impactam a realidade socioeconômica de muitas vítimas. Uma boa parcela dessas pessoas se mantém no relacionamento por questões financeiras.
Embora ainda incipiente, o poder público oportuniza recursos para auxiliar as vítimas. Um local de referência são as unidades da Delegacia da Mulher, as quais disponibilizam orientações jurídicas e psicossociais para reconstrução da vida das vítimas.
Onde denunciar? Caso esteja presenciando um caso de violência, pode ligar para 190. Caso não esteja vendo, porém saiba de uma mulher sofrendo violência, pode discar 180, Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, serviço do governo federal, gratuito e que preserva o anonimato.
Meta a colher. A violência contra a mulher é um problema de todos nós. Ela pode acontecer em qualquer lugar, com mulheres de qualquer idade, estatura, posição social ou endereço.
Esse foi o artigo mais difícil de escrever desde que comecei a parceria com o BT. Eu também sou uma mulher presente nas estatísticas de violência fruto de relacionamento abusivo. E, sim, eu já estava psicóloga e bem sucedida social e financeiramente quando vivi essa dor. Sei o quanto a rede de apoio faz a diferença para salvar uma vida. Denuncie.
A Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência – Ligue 180 – é um serviço de utilidade pública confidencial (preserva o anonimato). O serviço é atualmente oferecido pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos (MDH).
MAIS CONTEÚDO
Ouça o podcast da psicóloga Juliana Galvão no Spotify clicando aqui.
Até a próxima.
Juliana Galvão
Psicóloga
CRP 10/3645