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Paraíso do Tuiuti vai homenagear Mestre Damasceno e a Ilha do Marajó no Carnaval 2023

As terras paraenses possuem características únicas que só um estado cheio de energia poderia entregar aos conterrâneos. Quem visita o Pará se apaixona perdidamente, e não é para menos: as pessoas, os aromas, as comidas… Do misticismo aos animais silvestres, passeando pela arte e territorialidade, um estado com tantas características pode ser objeto de estudo para todo tipo de pesquisa, principalmente quando se diz respeito à cultura, que foi a abordagem procurada pela escola de samba carioca Paraíso do Tuiuti, que estará representando a Ilha do Marajó no próximo desfile de escolas de samba do Rio de Janeiro, em 2023.

De acordo com os registros, a criação do Grêmio Recreativo Escola de Samba Paraíso do Tuiuti foi fundada em 05 de abril de 1952, no Morro do Tuiuti, localizado no bairro carioca de São Cristóvão. Por não terem condições financeiras, os moradores do morro preferiam participar de blocos carnavalescos a acompanhar os desfiles das escolas de samba, especialmente porque, até então, os meios de comunicação principais eram o jornal impresso e o rádio, o que impossibilitava a população de ver e torcer. 

Em entrevista para o BT, João Vitor Araújo, o carnavalesco da escola de samba, contou de onde surgiu a ideia de homenagear a Ilha do Marajó. “A ideia surgiu do nosso presidente, Renato Thor. Ele pediu um enredo que fizesse uma homenagem ao Pará e, como o estado já foi retratado no Carnaval, buscamos trazer uma narrativa diferente e inédita, que foi quando chegamos à narrativa dos búfalos do Marajó”, contou.

Um dos aspectos culturais mais conhecidos da região do Marajó é a quantidade de búfalos que existem no arquipélago e seu viés turístico, então, pensando nisso, a Tuiuti foi atrás da história dos animais. Segundo o carnavalesco, tudo gira em torno da chegada dos búfalos à ilha. “O enredo trata da chegada dos búfalos na Ilha do Marajó e em como ele se transformou em uma grande manifestação cultural a partir do folguedo do búfalo-bumbá, criado pelo Mestre Damasceno, que é um típico personagem da cultura brasileira e que precisa ser mostrado para o Brasil”, adicionou Vitor. 

Na foto, um dos carros alegóricos produzidos pela Paraíso da Tuiuti, em 2020 | Imagem: Reprodução / Fernando Grili

O MARAJÓ NA AVENIDA

Na noite da última segunda-feira (14), Madson Santos, conhecido como “Embaixador do Marajó”, esteve presente no primeiro ensaio de rua da Paraíso do Tuiuti, ouvindo as composições e acompanhando o desfile. Segundo o embaixador, a energia daquele momento era cativante. “Foi surreal, uma energia incrível, todos cantando o samba falando do Pará com muito orgulho”, comentou.

O BT recebeu muitos registros do famoso embaixador do Marajó, que nos contou sobre seu encontro com o presidente da escola de samba, conhecido como Renato ‘Thor’ Marins, além de ter entregado presentes a alguns dos membros. “Na mala eu trouxe queijo do Marajó e cachaça de jambu para dar de presente ao presidente, carnavalesco, rainha da bateria e assessor de imprensa”, disse. Como retribuição, o embaixador ganhou o “manto” da Tuiuti, a camisa oficial da escola.

Madson Santos e a rainha de bateria da Paraíso do Tuiuti
Madson Santos e o presidente da Paraíso do Tuiuti, Renato ‘Thor’ Marins

Nos vídeos feitos durante o ensaio de rua compartilhados por Madson, é possível ouvir menções de elementos da cultura paraense e marajoara, como o carimbó, o “boi da cara preta do estado do Pará”, o canto do curió e muito mais. 

Madson ainda contou que a escola deseja muito que Gaby Amarantos participe do desfile e, principalmente, que um dos multiartistas mais conhecidos do Brasil, Mestre Damasceno, será o maior homenageado pela escola de samba e seu nome está no samba-enredo criado pela Tuiuti.

O PERSONAGEM ESCOLHIDO COMO HOMENAGEADO

Mestre Damasceno Gregório dos Santos é marajoara e de origem afro-indígena, uma peça-chave que transformou a cultura paraense através de suas produções, conhecido não apenas no Pará, mas no país inteiro. Da criação do búfalo-bumbá aos seus sambas, são mais de 400 composições, entre elas estão as 11 faixas de seu novo álbum, ‘Encontros D’água’, gravado em conjunto com outras 9 vozes marajoaras e lançado em janeiro deste ano. 

Quando perguntado sobre um personagem que representaria o estado do Pará no desfile de escolas de samba do Rio de Janeiro, João Vitor respondeu que ainda está sendo negociado, mas “querem muito o Mestre Damasceno conosco”. 

À esquerda, Mestre Damasceno e, à direita, Dona Onete | Imagem: Divulgação

Em entrevista para o jornal O Liberal, o Mestre disse que seu grande sonho era manter o ritmo vivo através das gerações futuras e que, ao descobrir que seria homenageado pela Escola de Samba, teve um momento de muita emoção, principalmente quando ele mesmo anunciou ao povo marajoara sobre a homenagem e foi aclamado pelo público durante um show. 

A história do Mestre é intensa. Aos 19 anos, ele perdeu a visão por conta de um acidente de trabalho, o que não o impediu de se tornar um multiartista, sendo repentista, cantador de carimbó, compositor de sambas, fazedor de rimas, poeta, pescador, artesão, criador do búfalo-bumbá em Salvaterra e muito mais. No documentário “Mestre Damasceno: O Resplendor da Resistência Marajoara” (dir. Guto Nunes, 2013), é contada a história do ícone tão querido no Marajó e no Pará.

Como o próprio artista reforça em seus discursos, a cultura paraense, especificamente a marajoara, deve ser preservada e comemorada por seus povos para que permaneça viva por gerações ainda por virem e, com a exposição nacional de um povo tão rico culturalmente, esse pode ser o momento de apresentar o que o segundo maior estados de um país-continente pode oferecer ao restante do planeta.