Representantes dos povos indígenas, comunidades tradicionais do Pará e Mato Grosso promoveram na última segunda-feira (4), em Santarém, um Tribunal Popular para julgar a criação da ferrorovia Ferrogrão (EF-170), seus impactos e as empresas cúmplices e financiadoras do empreendimento. Durante a programação, realizada na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), os representantes pautaram inúmeras violações de direitos e sentenciaram a extinção imediata do projeto.
Estiveram presentes organizações e comunidades indígenas, representantes de comunidades de pescadores, agricultores familiares e movimentos sociais.
O ‘tribunal’ trouxe argumentos de acusação como violação do direito à consulta livre, prévia, informada e de boa-fé; estudos falhos e subdimensionamento dos impactos e riscos socioambientais conexos; aumento da especulação fundiária, grilagem de terras públicas, desmatamento, queimadas e conflitos fundiários; e favorecimento indevido dos interesses das empresas transnacionais Cargill, Bunge, Louis Dreyfus e Amaggi.
“Estão violando o nosso direito de ser consultado. A BR 163 quase dizimou nossos parentes Panara e hoje com a construção da Ferrogrão, vão matar os povos indígenas. A Ferrogrão promoveu desde o início apenas audiências nas cidades, mas dentro das aldeias, nada aconteceu não existiu. Os povos Munduruku, Kayapo e Panara têm nossos protocolos de consulta que precisam ser respeitados”, disse Alessandra Korap Munduruku, presidente da Associação Pariri.
ENTENDA O CASO
As condicionantes indígenas do projeto, impactadas pelo empreendimento, destinadas a reduzir impactos negativos, se restringiam ao período de construção e os Kayapó Mekrãgnoti, que vivem na área de influência da BR-163 (cujo traçado é próximo à Ferrogrão) reivindicavam o processo de consulta ao Ministério dos Transportes desde 2017, o que ainda não foi atendido.
Em março de 2021, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu todos os processos relacionados à concessão da Ferrogrão acatando um pedido do partido PSOL baseado na inconstitucionalidade da desafetação do Parque Nacional do Jamanxim, localizado em Itaituba, no Pará. Logo em seguida, o Instituto Indígena de Novo Progresso, Kabu, que concentra lideranças de 12 aldeias e 193 famílias do sul do Pará, conseguiu ser admitido como amicus curiae (amigo da Corte) na Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Em meados de 2023, Moraes aceitou um pedido da Advocacia Geral da União (AGU) para que se buscasse uma solução de controvérsias. O governo criou um Grupo de Trabalho que, em sua primeira reunião, não se comprometeu com a Consulta.
Tanto Kayapó, como Munduruku que vivem no sudoeste do Pará, estão na área da Província Mineral do Tapajós e sofreram cisões nos últimos anos, com lideranças sendo cooptadas por garimpeiros. Os líderes contrários à presença ilegal de garimpos em seus territórios temem que os mesmos vagões de trem que irão carregar grãos para exportação nos portos do norte do país, acabem sendo usados para voltar com minérios, em um novo ciclo do ouro que irá significar destruição de florestas e mais contaminação de mercúrio nos rios.
Com informações do portal Ver-o-fato*