Uma pesquisa da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (Semob) sobre assédio nos coletivos de Belém revelou um dado assustador para as mulheres: mais de 50% das passageiras entrevistadas já sofreu assédio dentro do ônibus.
E este dado ainda é o resultado parcial do levantamento, que faz parte da campanha de combate à importunação sexual no transporte público. De acordo com a Semob, até o dia 29 de novembro, haviam sido aplicados 1.480 questionários e computados 501 desse total. A pesquisa foi encerrada nesta quinta-feira, 15 de dezembro.
Parcial
A primeira parcial da pesquisa constata que a maioria das entrevistadas está na faixa etária de 18 a 30 anos (47,31%); tem renda familiar de um salário mínimo (29,74%), foi assediada uma vez (56,69%), assediada mais de quatro vezes (31,34%). Desse total, 71,48% das mulheres entrevistadas informaram que sofreram assédio físico, porém 52,82% desse total não quis relatar o tipo de assédio sofrido; o “esfregão” foi mencionado por 29,23% como o mais frequente.
A grande maioria das entrevistadas (95,30%) informou que não registrou Boletim de Ocorrência. Houve quem não relatasse ter sofrido importunação, mas 35,73% já presenciou alguém sendo importunada.
A Lei de combate à importunação sexual e que tipifica essa prática como crime (Lei nº 13.718/2018) é desconhecida por 86,93% das mulheres entrevistadas. E 88,96% não conhecem a lei n° 9.591 de 4 de agosto de 2020, conhecida como a lei da parada segura.
Pesquisa
Os questionários já foram aplicados a usuárias de ônibus nos terminais do BRT (Maracacuera, Mangueirão e São Brás) e da Universidade Federal do Pará (UFPa). Esta semana, está sendo realizada em avenidas de grande fluxo como a Presidente Vargas e Boulevard Castilhos França, no Ver-o-Peso.
Ao todo, 15 servidores da Semob, de maneira escalonada, realizam a aplicação dos questionários e orientam as entrevistadas sobre as leis que as protegem e distribuem panfletos com informações sobre onde e como denunciar esse crime.
O questionário apresenta perguntas referentes ao perfil da entrevistada, tais como faixa etária e renda familiar. Além disso, se já sofreu importunação, quantas vezes, qual tipo de assédio (se físico ou verbal), qual o meio de transporte, se recebeu auxílio de alguém, se registrou Boletim de Ocorrência (BO) ou se presenciou alguém sendo assediada.
Ainda, se conhece as leis que tipificam a importunação sexual como crime e a lei municipal da parada segura, que garante à mulher, idosos e pessoas com deficiência solicitar ao condutor, de 22 horas até 6 da manhã, que pare fora da parada convencional em local seguro, sem prejuízo ao itinerário. Essa medida não vale no sistema BRT.
Direitos
A universitária Rebeca Tavares sofreu importunação mais de quatro vezes. A primeira vez, aos 15 anos. “Foi a primeira vez que andei de ônibus sozinha. Estava lotado. Ia para a escola e usava uniforme. Um homem ficou atrás de mim. Começou a se esfregar e a colocar a mão por debaixo da saia”, contou. Não entendia o que estava acontecendo e deu alarme. Rebeca conta que também já sofreu importunação verbal.
Segundo ela, se ocorresse alguma situação na atualidade, provavelmente iria exigir providências do motorista e procuraria a polícia. “Há a cultura de sempre colocar a culpa na mulher. Que ela sofreu assédio porque mereceu. Infelizmente é o que acontece”, pontuou a estudante, parabenizando a iniciativa da Semob em realizar a pesquisa e orientar as mulheres a denunciar essa prática criminosa e buscar seus direitos.
Boa aceitação
A iniciativa está sendo bem aceita pelas entrevistadas. “Era o que estava faltando. Vai ajudar muitas mulheres. Essa prática acontece muito. Não sofri importunação, mas familiares já sofreram e até acionaram a polícia”, disse a autônoma Samile Azevedo.
“Sofri importunação uma vez. Uma moça percebeu a situação e me tirou do lugar. Ela me puxou e pediu para eu sentar do lado dela e disse que um homem estava me olhando. Mesmo depois que sentei, ele continuava me olhando fixamente. Fiquei com medo e desci na mesma parada que ela”, contou a auxiliar de ótica Jennifer Silva.
“Não tomamos nenhuma atitude porque ficamos com medo”, lembrou Jennifer. Ela acha necessária essa iniciativa da Semob. “É importante a mulher tomar conhecimento dos direitos dela, porque isso acontece diariamente e como aconteceu comigo pode acontecer com outra pessoa”.
Informação
“Muito interessante. É uma coisa que todos nós deveríamos saber e não tem essa orientação”, disse a promotora de eventos Silvia Brabo, após a conversa com a pesquisadora e as orientações e informações repassadas.
“Pelo menos, eu não sabia essa coisa de lei porque não tenho tempo de estar pesquisando e não damos muita importância enquanto não acontece com a gente. Graças a Deus que comigo nunca aconteceu. Mas se um dia acontecer, já sei o que devo fazer. Como agir e denunciar”, finalizou.