A carcaça de um filhote de boto foi encontrada por pesquisadores na quarta-feira, 24 de setembro, nas margens de um lago da Amazônia que está secando devido à maior estiagem já registrada na região. O animal estava exposto na margem arenosa de um lago em Tefé, no Amazonas, que encolhe com a diminuição do nível das águas.
BOTOS VÍTIMAS DE ALTAS TEMPERATURAS
Com a seca se intensificando, as temperaturas da água vêm subindo, afetando gravemente os botos, uma espécie ameaçada de extinção. Na seca do ano passado, mais de 200 desses animais morreram no Lago Tefé devido ao calor excessivo. Miriam Marmontel, chefe do projeto de pesquisa em mamíferos aquáticos do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, relatou que a equipe encontrou uma média de um boto morto por dia na última semana.
“Nós não estamos associando diretamente essas mortes à temperatura da água, mas à crescente proximidade entre as populações humanas, como pescadores, e os animais”, explicou Marmontel. Com o recuo das águas, o espaço disponível para os botos no lago conectado ao rio Solimões diminuiu drasticamente.
NAVEGAÇÃO PERIGOSA E IMPACTOS NO HABITAT
O maior canal do lago Tefé, que costumava ser mais profundo, agora tem apenas 2 metros de profundidade e 100 metros de largura. Esse espaço é utilizado para o tráfego de várias embarcações, desde pequenas canoas até grandes balsas. De acordo com Marmontel, dois botos já foram mortos por colisões com barcos nessas águas rasas.
“Ninguém imaginava que essa seca chegaria tão rápido e muito menos que ela superaria a do ano passado”, lamentou o pescador Clodomar Lima, que vê com preocupação o avanço da estiagem.
Embora as mortes de botos ainda não tenham atingido os números registrados no ano passado, a seca ainda tem pelo menos mais um mês pela frente. O nível dos rios da bacia amazônica continua caindo, o que aumenta o risco para esses animais e outras espécies que dependem dos corpos d’água.
COMUNIDADES RIBEIRINHAS
Além da fauna, as comunidades ribeirinhas da Amazônia também estão enfrentando sérias dificuldades. Com o nível das águas muito baixo, o transporte fluvial — principal meio de locomoção dessas populações — foi interrompido, deixando muitas comunidades isoladas. As casas flutuantes, que costumam estar sobre as águas, agora repousam sobre o chão seco.
Francisco Álvaro Santos, morador da região do Lago Tefé, relatou que esta é a primeira vez em sua vida que sua casa não está sobre a água. “A água é tudo para nós, é parte do nosso dia a dia! Sem ela, nós não somos ninguém”, desabafou, ressaltando a dependência das comunidades ribeirinhas da Amazônia em relação ao transporte e ao ambiente aquático.
A seca histórica na região acende um alerta não apenas para as espécies ameaçadas, como os botos, mas também para os milhares de habitantes da Amazônia que têm suas vidas diretamente conectadas ao ciclo das águas.
*Com informações de Leonardo Benassatto em Tefé.